quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

60. TEM JAGUAR POR PERTO

Não assusta a pegada de um jaguar faminto,

que atravessou a aldeia ofuscado pela madrugada,

nem o marcado pio do pássaro noturno.


Homens sussurram das redes bem trançadas,

sorriem dos cães que tremem de medo,

buscando a olfativa presença no farol dos olhos.


De manhã as crianças vão para o rio,

e nadam sob os olhos ocultos da sucuri,

trazem frutos, empunham armas, riem...


Altíssimas e retilíneas árvores gemem,

na beira do córrego de águas transparentes.

Um tucano observa os passantes

com o bico ensimesmado.


O jaguar urrou de novo, mas ninguém liga.

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

59. INVERNO XXX

Havia certa glória na chuva, tristeza de beiral,

um sopro frio nos corredores da casa assombrada,

o silêncio de bois pastando longe, no cocal,

e o império dos mosquitos anunciando a invernada.


Aves singravam os ares para um destinol final,

tínhamos tempo, a estação da semente purificada

abria-se em flor no húmus fecundo da terra molhada,

e roupas não secavam mais, penduradas no varal.


Então esperávamos as chuvas de coração aberto,

contemplando a neblina esmaecida no horizonte incerto,

de mãos dadas com o frio que durante a noite viria.


Era tempo de ouvir o pio da coruja no telhado,

e as inhambus-chororó escondidas no capim molhado,

madrugada a dentro, até que despontasse um novo dia.



quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

58. TOCAIA XXX

No tropel invisível das mulas cardãs,

fruto doce, grito opaco, oco do sertão,

os cestos açoitados pelo olho do cão,

uma fala rouca na boca da manhã;


Não vi o tempo passar, bolando pelo chão,

o rifle apontado, coronha na espera vã

do queixal, sem pio de pássaro da hora sã,

o dedo seco, rogando o sinal da mão.


Um cheiro de besouro no ar purificado,

enquanto se contava as horas, esqueci

no leito do rio o silêncio santificado.


No torpor do sol onde canta o bem-te-vi,

desabei o corpo sujo no chão ressecado,

chorei mariposas, a morte não temi.

terça-feira, 21 de novembro de 2017

57. SOBRE A MINHA FALA XXX

Estou bem, mas choro, por dentro,

meu peito virou um córrego torto,

onde bichos noturnos aplacam a sede.


Vejo luzes tímidas, vozes ao longe,

o resto é silêncio ao redor, chama fria,

vacilando no vento constante da varanda.


Meu pensamento inválido, gira, 

afastado de mim mesmo, onde o gato

repousa os olhos de fogo.


Onde eu deixei a fala, não lembro,

um bago de coco abrindo, machado,

por certo, na fria sombra do mato.

56. ESPERANÇA MATEIRA XXX

Sempre tem um rastro no caminho, um alguém

abrindo a vereda onde o pássaro azul canta

e o sol invade o flanco da floresta santa.

Seguimos a luz sem ajuda de ninguém.


Sempre haverá esperança, esse voo para além

do horizonte, a mais alta copa que se espanta,

no revoar nervoso de mil asas que encanta.

Muitos caminham nessa vereda também.


Dê a mão, sinta o gosto da fruta temporã,

dance a ciranda, dê o beijo da boca irmã,

como se hoje fosse o teu derradeiro dia.


Sempre haverá saída, cantemos a vitória

daqueles que podem fazer a própria história,

abrindo a trilha com o facão da ousadia.

sábado, 11 de novembro de 2017

55. SINAIS XXX

SINAIS

Os sinais que vi, ninguém mais viu, é certo,

existiram como lembranças esgarçadas,
codinome do medo em loucas gargalhadas.
E calei, como que pregando no deserto.

Eu, jovem, tinha cisma com  o mar aberto,
temendo ouvir sereias em praias naufragadas
e sumir no mar, de lágrimas desfolhadas.
Vendi meu barco, por esse destino incerto.

Se os sinais que vi eram sonhos, não sei tampouco,
alimento poucas crenças, meu grito é rouco,
o olhar se apaga, como um farol de ilha perdida.

Esqueci de esperar, embora haja esperança,
nos sinais que te anunciavam, como lembrança,
no horizonte vermelho onde encantei a vida.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

53. ESTÁTICA DO SILÊNCIO

No meu coração

deveria brotar árvores

e repousar ninhos.

Somente a estática das pedras e do chão

fazem o musgo, crescem raízes, criam as nascentes.

A vida emerge sem pressa e sem clamor.

As presas sobrevivem da inércia,

e da invisibilidade.

É na dormência dos remansos que habita o peixe,

e no rumor da brisa que soçobra a folha.

Como demoram afundar as raízes, 

como esperam as estações as flores e os frutos...

Os rebentos se geram sonolentos no ventre da mães,

os embriões dos ovos exigem chocas sem pressa.

Dentro da minha casca vive o silêncio.

52. PERTO DA CHUVA

Rumor de pedras conversando,

na beira do rio, musgo, limo e água.

A cada sussurro, um revoar de asas,

vespas, besouros, tiúbas e joaninhas.


Floradas. Cajus, manga, sapotis e azeitonas.

Grandes sombras de piquizeiros, jaqueiras,

com enfeites de pau d´arcos em flor.

O chão estala, range e racha,

lufadas de calor no rosto,

claridade seca, luz faiscando a retina.


O sol vermelho, bola de fogo lisa,

cravada no céu curvo, desmaiando

sobre árvores tortas, em transe, desfolhadas,

e, forrando o chão, sementes, sementes...

domingo, 15 de outubro de 2017

51. CARRASCO XXX

Cada sol vermelho ardendo no céu,

árvores tortas, calor  vespertino.

Brandindo o chocalho, a tarde desce o véu,

e, triste, o mugido oco, grito de menino.


Vão-se os pássaros sem destino, 

sobre mourões farpados, favos de mel,

queima o fogo no olho da cascavel

e ruge a fornalha no sol a pino.


Um fartume de cinza queima o rosto,

o zunir de cigarras sem recosto

que pousam na sombra do piquizeiro.

 
O suor derrama no chão a contragosto

e o aço das mãos queima no formigueiro

a sina furiosa do boi vasqueiro.

sábado, 26 de agosto de 2017

50. PESCARIA DE VERÃO


Meus pensamentos ficaram boiando no rio.
Eram lembranças de remansos largos,
debaixo de galhadas tortas no céu liso de agosto.

Era algazarra de pássaro, derradeiro papagaio
voando para casa, cortando o horizonte vermelho.
Em redor, a luz se recolhendo nas copas...

Eu mesmo deixei de ver certas coisas,
o chão marcado de cascos, os peixes nas locas.
De ver pouco, ouvi, apenas. Bugios e grilos.

Quando soou um berro, triste, do fim do dia,
acompanhei a sineta dos bodes, perfilados,
na trilha onde no final algum galo cantou no terreiro.

domingo, 20 de agosto de 2017

49. AGOSTO

Agosto é o mês que inspira cuidados no sertão.

É o tempo das cobras, que saem para vadiar,

é o tempo dos cachorros loucos e outras coisas tais...

Mas por entre os punhos da rede entrevejo o céu,

no azul sem nuvens, cortado por andorinhas.

Ouço os bem-te-vis destruidores de ninhos

e o ruflar das varandas me anestesiando o sono.

O gato malhado ressonando no tamborete,

sempre vigiado pelo calango, não inspira confiança...

O fato é que tanta preguiça 

não tem nada com o mês de agosto...

E eu não vou reclamar, depois de comer tanto

- prefiro o ranger das escápulas.

48. SENTIMENTO DE ESTAR SÓ NO MUNDO XXX

Nunca pude olhar nos olhos da tristeza.
Ela sempre fugiu de mim, envergonhada...
Sou testemunha imune dos anos felizes,
e da mansidão do tempo, 
correndo como água do córrego.
Nunca entendi profundas mágoas,
grandes e indisfarçados ressentimentos,
porque estive com os pés na areia fina,
ou trilhei veredas sombreadas.
Não me convidem para festas,
aglomeraçõs onde as pessoas falam gritando,
e gesticulando para afugentar os pássaros.
Não me levem a lugares em que a música 
não é a da chuva no telhado .
Eu prefiro a luz do sol, o perfume do sal,
e longínquas barcas no horizonte.

terça-feira, 4 de julho de 2017

47.DELÍRIO XXX

Trago nas mãos a marca implacável

da lua vermelha no vasto sertão.

Árvores secas e trincado chão

orientam o caminho mensurável.


Ao largo voejar do bote execrável,

meu tordilho negro corre espantado,

e meu coração dispara abrasado,

ao tremor do gesto improvável.


Sem medo do túmulo irrenunciável,

a canção brotando do solo duro,

meu silêncio incendeia o quarto escuro.


Com as mãos tensas, o gesto imutável,

despedacei troncos no peito e no ombro,

e ouvi estalar meu grito com assombro.

quinta-feira, 29 de junho de 2017

46. CEMITÉRIO DOS ANJOS XXX

Eu me estranho ante o espelho quebrado,

mil faces retratam um espinheiro

do tucum; é da urtiga meu braseiro,

onde sinto o corpo em asas mutilado.


Insone, espero a luz do candelabro,

que orienta meu caminho indecifrável,

um tanto sangue, um tanto rosa afável,

na pedra rija do aluvião que lavro.


Eu me estranho diante do mundo triste,

onde pássaros morrem nas vidraças

e o homem fatigado não resiste.


Prefiro o ginete azul das desgraças,

o esgar da boca, o cutelo em riste,

o insano tropel das alvas carcaças.

domingo, 25 de junho de 2017

45. BERLIM

A outra metade está no secreto

interior de calda alma desterrada.

Entre nós há um muro de concreto

que faz do medo a língua mais falada.


Nascemos aborto, inconcluso feto,

contração da carne chorando o nada,

nu menino, sem mãe, sem pão e sem teto,

cavando a terra, órfão de foice e enxada.


A  face roída por um inseto

é o ventre aberto da mulher cansada,

o espasmo cru do coração inquieto.


Varíola dos anos, rede rasgada

onde o filho do filho fabrica o neto

e meu ciclo se fecha sem estrada.


sábado, 24 de junho de 2017

44. BUNKER

Alguém pode querer gritar ao lado

de mim, ferido e sem ninguém.

Que alguém pode assim ferir-se também

ao lado seu mais do que ao meu aberto lado.


Pois que chorar possa, não importa quem,

sob o seu flanco ferido e manchado.

Chore agora em soluço abafado,

ou alto grite, por algo ou por alguém.


Não choro eu. A minha dor aqui não cabe

e ninguém da ferida minha sabe,

mais que aberta em corte mais que profundo.


Porquanto posso, mesmo que ferido,

esquecer da ferida, adormecido,

homorrágico a tudo, a mim e ao mundo.

quinta-feira, 22 de junho de 2017

43. BACCHANALE

Morrer só, contando a moeda-miséria

tudo o que sobrará no final da festa,

como o que falta sem saber que resta.

Morrer é só, infecção diária, bactéria.


Deitar sujo em chão de mijos e bostas,

sentindo no pulso a obstruída artéria,

amante carnal da noite venérea,

corpo decepado em pútridas postas.


E resta no meu fétido final

solitário telhado de pedra e cal

onde meus ossos se dissolverão.


Morrerei só, como o jaguar final,

derradeiro da espécime fatal

de morte ferido em agreste sertão.


42. DEPRESSÃO

A dor que enfrento jamais foi pequena,

a morte que desafio desarmado

de mim, é como esse tempo alvejado

por mil balas da minha surda pena.


Agora tudo é pouco nesta arena

de leões famintos e ser devorado

cristão ou mesmo ser crucificado

pouco importa à vida sem paz terrena.


Se eu morro sem Deus ninguém dirá

tampouco: uma esquerda hora que virá

em algum dos meus dias que não espero.


Por enquanto aqui vivo sem saber

até quando sem Deus eu vou viver

na estrada louca desse desespero.



41.CAIS

Esperar o mar não é como uma espera

qualquer. O cais se avizinha no instante

azul, o barco imita o choro infante

onde em pó a luz do cais se desfizera.


O mar é tudo. Ânsia que desespera

alma presa no porto mais distante,

sol de gaivotas tristes no semblante,

mortalha da morte que não nos dera.


Espero. Ainda que à hora de partir

ninguém que espere por mim possa vir

em aceno de madrugada irreal.


Pois basta que eu não sinta o coração 

no peito oculto ao descanso da mão:

o mar lava a alma na insânia do sal.

40. COMBOIOS

Amontoados sob o frio dos arroios

eles nunca souberam madrugadas

em sonhos de ferrugens e comboios

os guerrilheiros de armas alugadas.


E muitos daqueles que se perderam

trigo nos campos estivais de outrora

foram soldados nus por quem morreram

sóis em fogo: por esses ninguém chora.


Ficando a marca em cada um de nós

o clamor surdo de um silêncio atroz

estrela cadente em confins da terra.


Ficou essa marca em cada um de nós

grito mudo na multidão sem voz

paz da pátria falsa no ardor da guerra.





domingo, 18 de junho de 2017

39. RÉQUIEM PARA UM VAQUEIRO

Perdoa, se matei o teu ginete alado,

na exaustão da rocha, no ferir da espora

cega, pestilento cão anunciando o caipora.

Perdoa rápido, que passarei cansado.


Não olha para a serra, no cume adensado

onde vou desaparecer ferido por agora,

entoando os cânticos da derradeira hora.

Ouve apenas, com o coração trespassado.


Se com o tempo minha presença de vapor

diluir-se nas manhãs de luz, fímbria e ardor,

lembra o canto, sina do cavaleiro morto


que deitou tantas árvores pelas raízes,

soçobrou paineiras, afugentou perdizes,

e assim tombou flechado por um anjo torto.

38. SOLIDÃO

Morre-se em decúbito, e sangrando o dorso,
onde o punho faz tinir chibatadas puídas,
sal branco por sobre a roxidão das feridas,
para calar o choro do meu navio corso.

Morre-se sem chão, com o lacerado torso
exposto ao bico das aves espavoridas.
Sem razão morro, sob árvores parricidas
que me deitam no corpo folhas de remorso.

Viúvo de mim mesmo, espero rubras flores 
que adornam jazigos e lágrimas sem cores,
curvas pontilhadas de cruzes nos caminhos.

Contarei o tempo no silício das chapadas 
que incendeiam troncos e víboras tresmalhadas
quebram no meio a espiral dos redemoinhos.

quarta-feira, 14 de junho de 2017

37.



36. NOTURNO

Espero que no dia amanheça 

a ternura,

E que bem rápido eu esqueça

a tortura


De abrir os olhos devagar

qual cego,

em noite escura do pensar

que nego





35. FUGITIVOS

Tivemos que suportar a dureza das pedras nos pés,

subimos encostas lisas, vencemos o medo paralisante,

repousamos vitoriosamente no cume onde pousam os loucos.

Os corpos feridos, ouvimos o rugir de negras panteras,

o líquido voo dos carcarás famintos sobre a terra.


Onde vamos vivem os seres que regurgitam flores,

no interior das florestas, cobertas de espessas brumas,

e o eco dos gritos apodrecem nos ouvidos de bugios moucos.

Haveremos de suportar ali o silêncio de ferro, 

o peso do ar gelado nos pulmões, enquanto os rios choram.

domingo, 30 de abril de 2017

31.


30. HALOPERIDOL



Um dia tudo apaga.


E nada vai importar ao redor, apenas estranhos ruídos no quarto.

Fantasmas escondidos em algum porão da mente,

correntes que se arrastam sozinhas no corredor.



As coisas estão se apagando,

um menino roto está limpando a janela do tempo,

e lá fora podemos ver a chuva, respingando a vidraça.


Queria poder demorar mais a infância

ver os pássaros antes que a noite chegue,

comentar o último gibi das bancas, 

mas você apagou antes das cortinas baixarem.


Queria tua mão, mas agora é tarde,

porque ela se fechou definitivamente,

incapaz de sentir o calor da ternura, a firmeza do gesto.


Na mesa, não posso mais te encarar a mesma face,

não posso mais ver o riso aéreo pedindo socorro,

refletido na louça do prato vazio, sem espanto,

e eu pensando como poderia ser diferente.





domingo, 23 de abril de 2017

28. QUANDO TODOS DORMEM



Enquanto todos ressonam
eu vigio o sono do meu herói.

Cada minuto que eu me despeço,
é esperança de mais um dia,
o rebento de uma planta.

Ele se agita, embalado por drogas
que percorrem as veias.

Conversando sobre uma juventude distante,
cada espanto se desfaz nas águas,
e não há delírio sem a resposta da ternura,
onde o fio dos dois destino se atam.

27.


 

 


26.


25. CORRENTES

Eu sei que estou atado a ele
na corrente do passado.

Posso ler na sua face 
a minha futura demência,
o meu encanto pavoroso
por silêncio e labirinto.

Ele engasga e treme, 
como um pardal no ninho.

Estamos presos no mesmo poste de linchamento,
ouvindo rezas, bater de janelas, escápulas rangendo...

Cada palavra torta soa como pedra 
lançada ao poço de dentro de mim.





24.



23. HOSPITAL


Lugar onde a morte ronda 
agachada e sorrateira,
como uma serpente emboscada.

Ouve-se na madrugada insone
o tropel de aladas bestas.
O balbucio dos terços 
sem sentido,
entre os dedos.

E a incontinência urinária dos idosos
que pressentem anjos cegos
atrás das portas.

22. TESTAMENTO




Resultado de imagem para ipês floridos

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Quando eu não tiver mais forças,
Quero ser a lembrança dos ipês floridos,
A doce trama das copas coloridas de amarelo,
Ornamentando uma parte do céu lavado,
Na agitação das abelhas
E na canção quase inaudível das águas.


domingo, 26 de março de 2017

18. PROFANAÇÃO


Longo murmurar dos vinhedos causticantes
assombram as mulas do destino cansadas
e roubam o sono de almas penadas
no estio noturno dos bichos claudicantes.

Dentes de cristal fazem tremer arvoredos,

Lua de prata ilumina cemitérios de meninos,
uivos órfãos fazem badalar os sinos
e trombetas ocas soam tristes arremedos.

Vou chegando a esmo na montaria cega,

varando a escuridão rubra dos girassóis mortos,
exalando o etílico bafo de mil sentinelas.

Chegarei recitando versos de poetas alados e banidos,

para o espanto soturno de milhões de morcegos peregrinos,
ao tempo em que adormeço ao coro dos anjos de bronze.






17.


sexta-feira, 3 de março de 2017

13.





12. TEMPO DO MILHO




O tempo do milho chega encharcado,
disputando espaço com ervas daninhas,
enfileirando penachos dourados,
que depois escurecem ressequidos.

É o tempo da relva verde e dos campos cheios,
dos cofos repletos de peixes pretos,
das armadilhas de nomes estranhos,
landroá, choque, jiqui ...

Os meninos correm empanturrados
de manga
de pequi
de bacuri
de jaca
                             com farinha



As mutucas insistentes
as muriçocas estridentes
os mosquitos renitentes
os maruins persistentes

Povoam a floresta
invadem as casas
forçam os bichos a adentrar na água
para esfriar o couro fervendo de picadas.

Chove no tempo do milho.
Uma chuva de trégua miúda,
tamborilando no telhado,
encrespando o frio nas redes noturnas.

Os papagaios e os periquitos revoam ao longe,
esperando a hora de atacar o milho.

Milho verde, milho maduro,
milho cozido, milho assado,
canjica e pamonha...