Estranho quando vem a morte
e paralisa tudo, vento, sol e céu,
deixando apenas o inventário da memória.
De menino caçador na imensidão dos campos,
até a velhice das mãos e dos olhos
poucos lembrariam, as lágrimas sulcando o chão.
Enrijecido corpo, urna de flores,
pela derradeira vez cruzando ruas da cidade,
um séquito de lembranças turvas em pleno dezembro.
O sino da capela chamará os desavisados.
Eles virão aos sussurros, estremunhados de espanto.
Estranho partir, estranho choro, estranho mundo...
sábado, 15 de dezembro de 2018
quarta-feira, 13 de junho de 2018
72. DIA ESPECIAL
Teria que ser assim: uma viagem sem destino,
o mar convergindo no azul do horizonte,
gaivotas seguindo em revoada a barca da emoção.
Teria que ser um dia especial!
um caminho de pedras em ruas estreitas,
a praia ao fundo de quintais sombreados
e o sol faiscando na fachada dos casebres.
À noite, com as mãos entrelaçadas,
ouvimos o ronco do mar na baía,
as estrelas pontilhando no horizonte fosco.
o mar convergindo no azul do horizonte,
gaivotas seguindo em revoada a barca da emoção.
Teria que ser um dia especial!
um caminho de pedras em ruas estreitas,
a praia ao fundo de quintais sombreados
e o sol faiscando na fachada dos casebres.
À noite, com as mãos entrelaçadas,
ouvimos o ronco do mar na baía,
as estrelas pontilhando no horizonte fosco.
terça-feira, 12 de junho de 2018
71. NOTURNO
À noite vejo como luz brilhando
aquela sombra no meu quarto escuro,
em minha direção teus pés flutuando
e ainda temo por mim, coração impuro.
Porque é noite, adormeço nos teus braços
calor envolvente, teu corpo nu,
vindo na pluma de longínquos passos
e exalando o cheiro de mato cru.
Tremo com a chegada silenciosa
e, a cada raiar do dia, é mais uma espera,
vigília permanente, amor sem fim
até que o sono me roube a imperiosa
consciência como outrora jamais soubera
ser tua áurea branca vindo para mim.
70. ALCÂNTARA
Tive sonhos que me guiaram dentro da noite,
loucos ginetes assustados com o puma;
Na calçada fria deitei na pedra do açoite,
contemplando as estrelas, como um mar de espuma.
Os dias foram duros, uma lenta agonia,
mas havia o disco do sol preso na garganta,
vespas rondando uma dolorosa alegria,
e um navio encantado na Semana Santa.
Ouvia-se a onda na rocha do Itacolomi
bramindo a fúria do sal no cair da tarde
e nós, com os pés feridos no sambaqui,
com o rei da bandeira em grande euforia
(o murmúrio espectral do mar sem alarde),
víamos a barca fantasma na ventania.
bramindo a fúria do sal no cair da tarde
e nós, com os pés feridos no sambaqui,
com o rei da bandeira em grande euforia
(o murmúrio espectral do mar sem alarde),
víamos a barca fantasma na ventania.
quinta-feira, 12 de abril de 2018
69. AURORA SOLITÁRIA
Estou bem, o silêncio é meu guia.
Lá fora, cantam pássaros
e o sol rompe nas frestas da janela.
A paisagem está cheia de vapor,
gotículas em suspensão invadem a casa,
Não penso mais na grande implosão,
joguei fora os cacos e os entulhos que restaram,
musgo e ervas daninhas cresceram sobre mim,
e vou me erguendo em busca da claridade.
Não faço mais cálculos para o futuro;
meu tempo é sólido e permanente,
como raízes fundas de um velho ipê.
Minha voz ecoa no corredor frio de um casarão abandonado
e vou andando e tateando em busca de luminosidade,
guiado pelo canto de bem-te-vis que fazem seus ninhos
no mirante auspicioso de frente para o mar.
quarta-feira, 11 de abril de 2018
68. PRECE DO ENTARDECER
Cada dia que passa eu me sinto mais terra.
E sombra, e pássaro e água do córrego.
Meu corpo não sente mais feridas,
nem o ladrar do cão que me dilacera.
Eu reuni forças para longas caminhadas,
renovei meus pulmões com o hálito das árvores
e não ouço mais o clangor das buzinas e motores.
Cada dia que passa eu dependo menos do amor
de humanos que habitam o cimento e o aço.
Meu rosto sorve a brisa de fora na janela
e meus braços estão abertos para o nascente,
onde nuvens incandescentes convidam a sonhar.
E sombra, e pássaro e água do córrego.
Meu corpo não sente mais feridas,
nem o ladrar do cão que me dilacera.
Eu reuni forças para longas caminhadas,
renovei meus pulmões com o hálito das árvores
e não ouço mais o clangor das buzinas e motores.
Cada dia que passa eu dependo menos do amor
de humanos que habitam o cimento e o aço.
Meu rosto sorve a brisa de fora na janela
e meus braços estão abertos para o nascente,
onde nuvens incandescentes convidam a sonhar.
sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018
67. MEMÓRIAS DE UM BAIXADEIRO
Épicos dias de travessia, reencontrando os guarás no céu azul, o boqueirão misterioso, a baía agitada;
Depois, a saudade do arroz de jaçanã e da farofa de jurará;
Como esquecer a dispensa dos queijos de São Bento,
as abelhas desgarradas e os paturis cantantes no terreiro;
As nuvens de mosquitos na enchente dos campos, o tanque de peixes, os bois marrequeiros e os caçadores;
Na memória ainda as viagens de canoa puxada à vara, cortando os mururus e orelhas de veado;
Longe, o melancólico horizonte de águas verdes;
Com esquecer minha presença na janela da casa grande, alongando a vista sobre a Ponta de Baixo;
e o grande armário de redes para o festejo de Santo Antônio,
ladeado por uma capela entupida de gente.
segunda-feira, 29 de janeiro de 2018
66. RIO DE PEDRA
Minhas manhãs anoitecem no rio
onde Iaras resplandecem as escamas
e o tucano alonga o bico em chamas,
resvalando o olho no meu desvario.
Minha riqueza é o inventário do sol
e milhões de partículas flutuando,
um trono de pedra, pássaro voando,
e o entardecer crucificado no anzol.
A liberdade vai além da lua morta,
onde o pensamento voa como uma harpia.
É simples, perigoso e ninguém se importa
com esse clarão na casa vazia,
o coaxar de sapos na mente absorta
e o silêncio de ferro que a água urdia.
onde Iaras resplandecem as escamas
e o tucano alonga o bico em chamas,
resvalando o olho no meu desvario.
Minha riqueza é o inventário do sol
e milhões de partículas flutuando,
um trono de pedra, pássaro voando,
e o entardecer crucificado no anzol.
A liberdade vai além da lua morta,
onde o pensamento voa como uma harpia.
É simples, perigoso e ninguém se importa
com esse clarão na casa vazia,
o coaxar de sapos na mente absorta
e o silêncio de ferro que a água urdia.
quinta-feira, 25 de janeiro de 2018
65. REENCONTRO
Fazia tanto tempo que eu não te via.
Fui envelhecido pela distância,
mais por um escaravelho da infância,
do que pelo tempo que em mim cabia.
Você não mudou. Minha nostalgia
de não poder tê-la perdeu a importância.
Estamos longe, na fria ignorância
do nosso destino, sem alegria.
Quando você partiu era um sol glacial
queimando meu rosto paralisado,
de fogo e frio, alívio capital.
num imenso jardim coberto de sal,
e o mar invadiu meu rosto queimado.
quarta-feira, 17 de janeiro de 2018
64. MARCADO PRA MORRER
Em memória de Flaviano Neto, líder do quilombo Charcho,
em São Vicente de Férrer, assassinado em 30 de outubro de 2010.
Dia de receber notícia da morte:
uma serpente que levanta a folha,
estampado na água do rio sem porto.
E ficou no ar gelado o aceno em vão,
em São Vicente de Férrer, assassinado em 30 de outubro de 2010.
Dia de receber notícia da morte:
uma serpente que levanta a folha,
o escorpião oculto na terra zarolha,
o espinho de tucum vigiando a sorte.
Quisera saber que fora abraçado,
sem saber que a morte estava por perto,
um jaguar urrando no campo aberto,
sopro da brisa no rosto molhado.
E toda noite revivo a lembrança do morto,
aquele sorriso de sofrimento,
aquele sorriso de sofrimento,
estampado na água do rio sem porto.
E ficou no ar gelado o aceno em vão,
a sineta no cordeiro imolado,
e o sangue do altar derramado ao chão.
domingo, 7 de janeiro de 2018
63. DOUTRINA
Sou apenas esse cavaleiro enlouquecido
sem o medo de me atirar no abismo.
Toda vez que me alcança o paroxismo
do ódio adormeço o pavor comedido.
Meu ginete bufa e salta, aguerrido,
entre alba e noite, suave antagonismo,
por onde arremeto o sonambulismo
da cruz e do espinho, o peito ferido.
No tinir dos ferros e da espora,
nunca temi a morte, nem o trovão
que no martelo de Badé evapora.
Passo firme, ateio o fogo com a mão,
carrego a toalha no ombro e vou-me embora,
filho que sou do aço e do trovão.
sem o medo de me atirar no abismo.
Toda vez que me alcança o paroxismo
do ódio adormeço o pavor comedido.
Meu ginete bufa e salta, aguerrido,
entre alba e noite, suave antagonismo,
por onde arremeto o sonambulismo
da cruz e do espinho, o peito ferido.
No tinir dos ferros e da espora,
nunca temi a morte, nem o trovão
que no martelo de Badé evapora.
Passo firme, ateio o fogo com a mão,
carrego a toalha no ombro e vou-me embora,
filho que sou do aço e do trovão.
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