terça-feira, 21 de novembro de 2017

59. SOBRE A MINHA FALA

Estou bem, mas choro, por dentro,

meu peito virou um córrego torto,

onde bichos noturnos aplacam a sede.


Vejo luzes tímidas, vozes ao longe,

o resto é silêncio ao redor, chama fria,

vacilando no vento constante da varanda.


Meu pensamento inválido, gira, 

afastado de mim mesmo, onde o gato

repousa os olhos de fogo.


Onde eu deixei a fala, não lembro,

um bago de coco abrindo, machado,

por certo, na fria sombra do mato.

58. ESPERANÇA MATEIRA

Sempre tem um rastro no caminho, um alguém

abrindo a vereda onde o pássaro azul canta

e o sol invade o flanco da floresta santa.

Seguimos a luz sem ajuda de ninguém.


Sempre haverá esperança, esse voo para além

do horizonte, a mais alta copa que se espanta,

no revoar nervoso de mil asas que encanta.

Muitos caminham nessa vereda também.


Dê a mão, sinta o gosto da fruta temporã,

dance a ciranda, dê o beijo da boca irmã,

como se hoje fosse o teu derradeiro dia.


Sempre haverá saída, cantemos a vitória

daqueles que podem fazer a própria história,

abrindo a trilha com o facão da ousadia.

sábado, 11 de novembro de 2017

57. SINAIS

Os sinais que vi, ninguém mais viu, é certo,

existiram como lembranças esgarçadas,

codinome do medo em loucas gargalhadas.

E calei, como que pregando no deserto.


Eu, jovem, tinha cisma com  o mar aberto,

temendo ouvir sereias em praias naufragadas

e sumir no mar, de lágrimas desfolhadas.

Vendi meu barco, por esse destino incerto.


Se os sinais que vi eram sonhos, não sei tampouco,

alimento poucas crenças, meu grito é rouco,

o olhar se apaga, como um farol de ilha perdida.


Esqueci de esperar, embora haja esperança,

nos sinais que te anunciavam, como lembrança,

no horizonte vermelho onde encantei a vida.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

56. MENINO DO SERTÃO

Fui menino que flutuou na correnteza,

o cobertor de sol sobre a pele queimada,

branca pluma, e tinha o afago de brisa alada ,  

imóvel remanso na água da tristeza.


No verão era a vertigem do redemoinho,

tapete de folhas, frutos caídos ao chão,

 o círculo do sol vermelho do sertão,

garranchos e cipós de multiagudo espinho.


De noite, ouvia o touro negro no curral

e a acauã anunciar o mormaço repentino;

na rede, entrevia passarinhos no beiral.


Dia de vento, era o ruidoso estrondo de portas,

o zigue zague zunindo das folhas mortas 

e o guincho dos macacos dentro do cocal.