domingo, 29 de outubro de 2023

116. ARRANCANDO PEDAÇOS

No tempo que eu e ele andávamos pelo mundo,

a cidade cabia nos nossos pensamentos

(ruas que davam em trilhas

e trilhas que desaguavam em quintais e passarinhos).


A vida passava desapercebida nos pomares,

e a chuva pontualmente chegava no dia de finados,

sendo avistada dias antes, ao longe, no horizonte,

por trás das serras nos planaltos azuis.


Agora não se houve mais o chocalho agudo dos carneiros

nos arredores de povoados e de fazendas 

nos tabuleiros entre o rio Balsas e o velho Manoel Alves Grande.

Não tem mais pescaria na cheia dos rios,

e nem revoadas de pomba galegas por sobre os buritizais.


Não há mais meninos de pés descalços

 em busca de cajuís

nas mais distantes florestas do riacho Frutuoso.

Foram embora aqueles senhores 

envelhecidos nas chapadas

que contavam estórias de onças e capelobos,

sentados em cadeiras de vime ao longo das calçadas.


Hoje eu procuro nossos rastros na cidade vazia 

de sonhos,

de casas de corredores imensos,  

de janelas abertas ao vento passageiro, 

sem avozinhas no parapeito, 

sem vasos de flores amarelas.


A cidade encantada se perdeu, 

cercada por infinitos campos de soja.


Nenhum comentário:

Postar um comentário