Minhas manhãs anoitecem no rio
onde Iaras resplandecem as escamas
e o tucano alonga o bico em chamas,
resvalando o olho no meu desvario.
Minha riqueza é o inventário do sol
e milhões de partículas flutuando,
um trono de pedra, pássaro voando,
e o entardecer crucificado no anzol.
A liberdade vai além da lua morta,
onde o pensamento voa como uma harpia.
É simples, perigoso e ninguém se importa
com esse clarão na casa vazia,
o coaxar de sapos na mente absorta
e o silêncio de ferro que a água urdia.
segunda-feira, 29 de janeiro de 2018
quinta-feira, 25 de janeiro de 2018
65. REENCONTRO
Fazia tanto tempo que eu não te via.
Fui envelhecido pela distância,
mais por um escaravelho da infância,
do que pelo tempo que em mim cabia.
Você não mudou. Minha nostalgia
de não poder tê-la perdeu a importância.
Estamos longe, na fria ignorância
do nosso destino, sem alegria.
Quando você partiu era um sol glacial
queimando meu rosto paralisado,
de fogo e frio, alívio capital.
num imenso jardim coberto de sal,
e o mar invadiu meu rosto queimado.
quarta-feira, 17 de janeiro de 2018
64. MARCADO PRA MORRER
Em memória de Flaviano Neto, líder do quilombo Charcho,
em São Vicente de Férrer, assassinado em 30 de outubro de 2010.
Dia de receber notícia da morte:
uma serpente que levanta a folha,
estampado na água do rio sem porto.
E ficou no ar gelado o aceno em vão,
em São Vicente de Férrer, assassinado em 30 de outubro de 2010.
Dia de receber notícia da morte:
uma serpente que levanta a folha,
o escorpião oculto na terra zarolha,
o espinho de tucum vigiando a sorte.
Quisera saber que fora abraçado,
sem saber que a morte estava por perto,
um jaguar urrando no campo aberto,
sopro da brisa no rosto molhado.
E toda noite revivo a lembrança do morto,
aquele sorriso de sofrimento,
aquele sorriso de sofrimento,
estampado na água do rio sem porto.
E ficou no ar gelado o aceno em vão,
a sineta no cordeiro imolado,
e o sangue do altar derramado ao chão.
domingo, 7 de janeiro de 2018
63. DOUTRINA
Sou apenas esse cavaleiro enlouquecido
sem o medo de me atirar no abismo.
Toda vez que me alcança o paroxismo
do ódio adormeço o pavor comedido.
Meu ginete bufa e salta, aguerrido,
entre alba e noite, suave antagonismo,
por onde arremeto o sonambulismo
da cruz e do espinho, o peito ferido.
No tinir dos ferros e da espora,
nunca temi a morte, nem o trovão
que no martelo de Badé evapora.
Passo firme, ateio o fogo com a mão,
carrego a toalha no ombro e vou-me embora,
filho que sou do aço e do trovão.
sem o medo de me atirar no abismo.
Toda vez que me alcança o paroxismo
do ódio adormeço o pavor comedido.
Meu ginete bufa e salta, aguerrido,
entre alba e noite, suave antagonismo,
por onde arremeto o sonambulismo
da cruz e do espinho, o peito ferido.
No tinir dos ferros e da espora,
nunca temi a morte, nem o trovão
que no martelo de Badé evapora.
Passo firme, ateio o fogo com a mão,
carrego a toalha no ombro e vou-me embora,
filho que sou do aço e do trovão.
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